sexta-feira, 21 de agosto de 2020

A razão


Quando a voz da razão fala mais alto, e o coração bate mais forte, estejamos longe ou perto, sós ou acompanhados, felizes ou desamparados, lembramo-nos sempre daquele cantinho perdido, quase abandonado, onde aprendemos a dar os primeiros passos, a dizer as primeiras palavras, a reconhecer os sons e os perfumes do que fica para sempre amolecido dentro de nós, a fermentar com a lentidão dos confins da terra, donzela de nobreza singular sem títulos, mas com poderes sobrenaturais, que nos enfeitiça nos transforma em amor incondicional, que guardamos numa caixinha de alimentar sonhos, nostálgica de vez em quando, à qual jamais renunciamos totalmente, porque esta voz, rouca, tímida ou pungente está sempre presente para nos lembrar quem somos e de onde viemos.

A vida dá voltas sem fim, como o rodízio de um moinho, enquanto não lhe cortam a fonte essencial que alimenta a sua rotação, e nós pobres mortais, esquecemo-nos que somos meros passageiros, envolvendo-nos em quezílias insignificantes, rixas familiares por bens ou situações sociais, cortando laços de amor ou amizade que outrora nos uniram com tanta força! Esquecer pode ser fácil para quem transporta a frieza, presunção, as gírias malignas e contaminantes, mas é a maior das cobardias camufladas, que o ser humano utiliza para ignorar ou sair de situações embaraçosas. Lamentamos ou fingimos lamentar situações que excederam a nossa dignidade, quando um de nós parte para a eternidade, e de negro vestidos, apresentamos os pêsames que só são sentidos na linguagem protocolar; vamos a velórios apenas para fazer parte da lista hipócrita, e com flores sem perfume embelezam a viagem final.

A voz da razão falou também em tempos de festividades, que por motivos de saúde não se organizaram este ano. Porém, os filhos da terra vieram numerosos marcar presença como sempre, seguindo regras ou infringindo-as inconscientemente, levados pelo poder do desejo, e a concretização dos sonhos ou saudades das quais apenas podem usufruir de ano a ano.

Voltar à sua terra é sempre um renascimento, é assim que o “Puto de Vale dos Amieiros” descreve a sua vida juntamente com aqueles que amou e conviveu, num livro de reflexões, crónicas, e vivências.

 


Sem comentários: