quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Quando tinha vida boa

  “Quando tinha vida boa”…
Dizia o Óscar, meu sobrinho, ao postar esta foto de caras familiares e bem conhecidas dos sobreviventes à eufórica desertificação da bem conhecida e reputada Aldeia de Murçós, numa rede social… como eu te compreendo, meu rapaz! A vida não era assim tão boa no sentido próprio do termo, porém, na nossa juventude, apesar das numerosas peripécias que frequentemente desaguavam em percalços, contentávamo-nos com fragmentos do pouco que havia para distribuir, ao qual atribuíamos incondicional apreço, sem invejas vaidades nem outros sentimentos supérfluos que pudessem contagiar a aprazível felicidade, vinda de um simples gesto, presenteada simbolicamente, recebida com carinho humildade e amor. As coisas tem o valor que o ser humano lhe quiser atribuir, e quem não sabe valorizar o pouco, dificilmente poderá dar apreço ao muito… Eram outros tempos! Não vamos ser donos da razão e recriminar a evolução inevitável dos tempos frutífera e tão desejada… são esporádicas passagens nostálgicas que nos retrocedem no tempo e na maneira incentivando-nos a comparar, enaltecer, e por vezes criticar, fundamentados em argumentos alargados mas, nem sempre justificados.
Nesta quadra Natalícia, ladeados por cintilantes luzes de formas e coloridos diferentes, ornamentações majestosas, num frenesi dimensional quase apocalíptico, esquecemos mais facilmente um dever cívico e moral, humanístico o qual requereria especialmente a nossa atenção, como pobres mortais, sujeitos a tropeçar e cair na fatalidade caritativa, que nos humilha, envergonha, e martiriza o coração, frágil, ferido no amor-próprio que a dignidade tenta proteger nos esconderijos gelados, mortíferos, por não serem de ferro, sucumbiram à fome, sede, mas sobretudo à indiferença de quem passa bem perto deles, vestido e calçado com pérolas raras, apressa o passo para não chegar atrasado ao copioso repasto confecionado com os melhores produtos do mundo, no aconchego de mansões luxuosas, onde o calor se mantem à temperatura desejada, e os ânimos aquecem com o álcool ingerido, enquanto se aguarda a hora de abertura das ricas prendas, designada pelas doze badaladas do sino o qual
repenicará no dia seguinte com sinais defuntos. Todos sabemos e temos consciência de que Deus apenas enviou um salvador ao mundo, segundo as escrituras, contudo, por vezes, um pequeno gesto basta, para fazer a felicidade de quem vive sentindo-se só, desamparado, excluído… pese-nos a consciência durante todos os dias do ano, lembrando-nos dos que tem fome e frio, que vivem isolados e martirizados pela solidão, que esperam e ninguém vem bater à sua porta, dos idosos abandonados entre quatro paredes que lhe chamam “lares”, enfim… dos que não tem família para lhe desejar as boas-festas.
Quando tinhas vida boa, meu rapaz… eras apenas um puto que jogava ao pião, ou ao burro pelado no adro da Igreja ou no outão; não te sociavas com o que precisavas na mesa á hora do almoço ou jantar… alguém o fazia por ti. As roupas e o calçado apareciam no teu quarto, não por obra do Divino Espirito Santo? Alguém velava por ti… esse alguém está a teu lado, na foto e no céu, porque era um bom pai… um homem íntegro, honesto e trabalhador, que só desejava, como todos os pais, o bem-estar para os seus filhos.
Importante seria o reconhecimento do débito sem fiadores… para ter uma vida boa é necessário lutar por ela… herança não são apenas bens materiais; são sobretudo ensinamentos de princípios e valores dos quais se possam orgulhar os professores.
A vida é realmente boa, aparentemente, na infância e adolescência, sem compromissos nem responsabilidades, dores de cabeça nem insónias … mas, é nesta idade que se começa a urdir um futuro proporcional aos desejos e esperanças… toda a casa se começa a construir pelos alicerces, deles dependerá toda a restante estrutura. Também me recordo da minha vida boa, a de puto a quem o pai natal deixava no soco uma laranja ou dois rebuçados com os quais ficava radiante de alegria na manhã do dia seguinte, vindo a correr para a lareira, por onde ele era suposto passar… era um pai natal dos tempos pobres, que trazia o que podia, e nós agradecíamos felicíssimos. Tantos anos já passaram, e os pais natais se sucederam, sempre com o mesmo espirito convivial familiar, comemorando o nascimento de Jesus, o qual sempre trouxe para alguns, saúde paz e amor, como “no tempo em que tinhas vida boa”



6 comentários:

Fátima Pereira Stocker disse...

Tonho

Venho desejar-te as boas-festas. Amanhã estou de abalada para Rebordaínhos

Beijos

Anónimo disse...

amigo António pereira.
Como vão estes dias após a colheita da azeitona? Vejo que bem, mas passados em frente ao computador.
Como amigo, embora goste das sua publicações não o quero ver apenas metido em casa.
desejo-lhe a si e a sua família um feliz natal e um prospero ano novo, cheio de saúde, são os voto deste amigo.
Vítor Fernandes.
até qualquer dia...


antonio disse...

Santo Natal para ti também Fátima... quem sabe se ainda nos vemos lá pela terrinha' Beijos

antonio disse...

Olá Vitor! Bem- hajas pela atenciosa amizade, e desde já desejo para ti e os teus festas felizes com saude paz e amor... é verdade que me tenho retraído daquele ambiente que tanto prezava e que ainda hoje apesar de reduzido é um dos principais atrativos que vão chamando o pessoal à terrinha... as razões, se existem, ficam nos segredos dos Deuses. Vamo-nbos refugiando como podemos por detrás da transparencia desgostosa que nos mina e envelhece ainda mais, mas enfim,,, como diriam os franceses: "cest la vie!"
Abração, cumprimentos para a tua esposa, e ternos beijos para essas duas magnificas pequenas rosas.

Anónimo disse...

Quado tive vida boa,
Foi quando era menininho,
Os outros por min pensavam
Pois eu era pequenino!

Pequenino e tenra idade,
Cheio de muitos mimos,
Não havia maldade,
Isto é coisa de tempos idos!

Nada me preocupava,
A não ser a brincadeira,
Porque é que não é sempre assim
E tem de ser de outra maneira!

Um grande abraço e votos de um feliz Natal António!

antonio disse...

Obrigado Sr.(a) anónimo, por estas lindas quadras que refletem a humildade sincera infantil...
Votos de um Santo Natal