sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Saloio parte III

O saloio foi crescendo suportando os pontapés de uns o desprezo de outros, com fome sede, esfarrapado, tal um mendigo que em tardes Primaveris se ia sentar naquelas escadas altas de granito, onde algumas vezes foi brindado com um carolo de centeio que uma familiar de bom coração lhe tendeu sempre que sentia que naquele olhar meigo e triste havia fome. Pelas tardes saía de machada nas mãos, a pedido da mãe, procurar uma (rama) de carvalho, cortada em touças cujos proprietários guardavam ou vigiavam de longe, dos numerosos filhos do diabo, como eles diziam, para à noite se aquecerem. (e eram tão numerosos que junto aos caminhos públicos nem as giestas tinham tempo de crescer) Com a emigração para a África e Brasil as famílias numerosas e carenciadas foram diminuindo, contudo continuavam a trabalhar cinquenta pobres para meia dúzia de remediados, sobretudo para aqueles que se julgavam nobres, pelo facto de serem filhos de… Nas eiras onde malhavam o centeio, vinham cobrar empréstimos concedidos, deixando as famílias sem um grão para coser pão aos filhos esfomeados no dia seguinte. Foi desta forma que alguns destes lordes adquiriram bens, subindo na vida com a descida de outros. Sem barafustar iam suportando, curvando-se à passagem destes respeitáveis senhores… até que a emigração para os Países europeus, começou a dar asas à pobreza, ainda que a contradição ditadora tentasse impedir a felicidade dos oprimidos.
Também o saloio, quando completou onze anos teve a oportunidade de viver farto e feliz junto da família adotiva à qual ficará grato para o resto da vida. Lamenta um fim tão triste de uma família tão generosa e respeitada, mas na humanidade só existe falsidade, e também eles foram traídos por promessas que jamais cumpriram. Vai muitas vezes visitar as suas campas, jazigos ainda comprados enquanto viviam, hoje deteriorados, quase abandonados não acontecendo o mesmo com os bens legados. Foi-lhe ainda dada a oportunidade de estudar para padre, mas, como não se sentia vocacionado para as funções sacerdotais, recusou, desfazendo-se em estilhaços um sonho de menino em detrimento da honestidade.
Já adolescente, começavam os namoricos, chegava o tempo de voar como as andorinhas para outros horizontes, ainda que penosamente, porque agora existia alguém que o prendia, àquele buraco de ratos. De coração ferido, levantou voo para Paris, uma noite de outono, dia de todos os Santos exatamente. Atravessou montes e vales, serras e riachos, pondo em risco a sua própria vida na travessia das duas fronteiras bem guardadas e vigiadas noite e dia. Estávamos em 1968, ano fatídico de greves e manifestações que paralisaram a França durante mais de um mês. Obrigado a ir para a província onde lhe era proporcionado um emprego rural, longe de tudo e de todos não resistiu, voltando de novo para Paris onde os seus compatriotas pediram aos patrões admissão na construção civil embora sem conhecimentos nesta área.»» continua




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