sábado, 11 de abril de 2020

Semana santa

 Semana Santa
Situando-nos no tempo e no lugar, de outros tempos, foi em mil novecentos e sessenta e sete, o da adolescência de tantos jovens, como eu, residentes naquela eutimia Aldeia, já despida do manto branco invernal, e os tépidos raios de sol invadiam os cantos mais recônditos que as numerosas flores campestres observavam de longe, onde os verdes castanheiros, carvalhos e urzes floridas abundavam, aos quais se jantavam o amarelado da carqueja na colina da fraga do “berrão”; estávamos na semana santa e os usos e costumes eram acatados com o máximo rigor, tanto os religiosos como os tradicionais. Havia deveres e restrições, tais como: confissões, o sino deixava de tocar durante dois dias, e era com umas “matracas”, (era assim que lhe chamavam) feitas de madeira artesanalmente, (três sobrepostas) que os rapazes percorrendo a rua principal anunciavam a hora da via-sacra. Não se comia carne e havia dias de jejum e abstinência. Era também nesta semana que se confecionavam os famosos folares de Trás-os-Montes, amarelinhos e repletos de carnes diversificadas, (porco e enchidos) cosidos em grandes fornos de lenha, dentro de formas muitas vezes improvisadas servindo-se do que possuía a casa. Os maravilhosos cheiros e sabores que faziam a felicidade de gente simples, modesta, heranças de pais e avós, e se mantiveram até que o progresso veio alterar, por esta ou aquela razão.
No sábado de “aleluia” repenicavam os sinos, desde meio- dia até ao dia seguinte, e a juventude juntava-se à enorme lareira para conviver não arredondo pés mesmo que o sono os invadisse.
 No dia de Páscoa, pelas nove horas e meia o Santa Combinha, tocava à missa, e aqueles rapazes mais “fanfarrões” tentavam fazer dar uma volta completa ao sino, proeza que não era para toda a gente… entretanto, à entrada principal do adro encontrava-se um “traço” de mulher, maquilhada e vestida elegantemente com uma minissaia provocadora, como nunca se tinha visto por estas paragens, sapatos de salto alto, uma cabeleira surpreendente volumosa com madeixas, boca pulposa, lábios grossos e pintados de um encarnado vivo, um decotado subjetivo acentuado e um casaco azul comprido desabotoado que lhe dava um ar de vinda de outra Galácia. Toda a gente a conhecera, antes de ter emigrado para França, vivia numa quinta próxima, chamavam-lhe então a “filha do moleiro”. Porém, a transformação fora tão acentuada e ousada, que metade dos habitantes da aldeia, sobretudo os rapazes a babarem-se como cães, ficara ali, hirtos, a observar a “Brigite Bardot” do lugar. Entretanto, tinham já dado o terceiro toque de sino, e a D. Graça e professora, mulheres devotas e com a barriga cheia de preconceitos faziam a sua aparição não esperando muito tempo para fazer ouvir as suas vozes repressivas dizendo: - Que pouca vergonha… quem é você? Vá vestir-se convenientemente caso contrário não entrará nesta igreja. E vós, gente pecadora, viestes à missa ou para ver este triste espetáculo?
A rapariga que já tinha passado a época da submissão, lá por terras de França, apenas retorquiu_
- Quem não gosta não olha…
Entrou para a igreja, perante os olhares fulminantes, das duas devotas, e os de admiração de outros entusiasmados, com sorrisos maliciosos nos lábios por a rapariga ter resistido, como quem diz: - a palavras loucas orelhas “moucas. (surdas). Porém  as senhoras voltaram à carga à saída da eucaristia, mas a moça não estava disposta a obedecer. Muitos foram os pretendentes à conquista do seu coração, e, apesar de pertencer a uma família modesta, podia agora escolher aquele que mais oferecia em termos de estabilidade…são relações amorosas passageiras e os pais de alguns pretendentes, trouxeram à realidade os seus descendentes.
Segunda de páscoa, pela tarde reuniam-se todos os jovens para os jogos de “roda” tradicionais realizados nas eiras da portela, cubelo, ou na do tio António “piloto”. As cântaras de barro (mais tarde de zinco) saltavam de mão em mão, e as “cantilenas ouviam-se por todo o povoado. As mães de algumas dançarinas vinham certificar-se que não passava de uma brincadeira e não arredavam pé enquanto o espetáculo não acabasse.

Lembro-me de algumas que se cantavam e dançavam, mas com o passar do tempo o buraco do esquecimento torna-se cada vez maior.
Ao passar a ribeirinha
Onde a água sobe e desce
Dei a mão ao meu amor
 Não quis que ninguém soubessaqui,
Aqui aqui aqui,
Aqui é que eu heide estar
Ao pé do meu amor
Toda a noite a namorar
ENTRA O FARFALHÃO AO MEIO
GRANDE DATA VAI LEVE
AI, AI, AI, QUE NÃO HADE FALTAR
ÓH COM QUEM CASAR, OH COM QUEM CASAR
- JÁ LEVASTE UM CABAÇO
DOIS OU TRÊS HADES LEVAR
AI,AI,AI, QUE NÃO VAI FALTAR
Ó COM QUEM CASAR, Ó COM QUEM CASAR
Senhor padre me confesso
Larau, larau larito
Senhor padre me confesso
Que matei o seu gatito
A penitência que te dou
Larau larau larito
A penitência que te dou
É dar ali um beijito 




Sem comentários: