segunda-feira, 11 de abril de 2022

Mais um dia

O dia apareceu cinzento, escuro, e a chuva não tardou a juntar-se mansa e leve como quem tem receio de cair. É Segunda-feira, um dia como tantos outros que vão passando desacautelados, abrindo grandes portas à solidão no interior de uma casa fria de afetos e parca de agremiação, onde nem o zumbido dos insetos se pode ouvir correndo as flores para lhes sugar o pólen. Os passos vão-se tornando cada vez mais ronceiros, percorrendo os escaninhos onde estão guardados sigilos, confidencias, silêncios, confissões, discrições, intimidades, privacidade que lentamente se tornarão prestos para mais tarde serem amarfalhados por enraizamento abominador, n’uma desmemória aferrado. As minhas lentas e curtas caminhadas ajudam-me à inspiração de escrever, e as colinas acolhem gratuitamente um penar, sem cura; pinheiros, oliveiras, e o verdejante dos castanheiros trazem às minhas recordações tempos idos, e nostalgicamente vejo de olhos encharcados os anos 50/60/ e 70 onde Murçós e a minha terra amada Rebordainhos eram Aldeias de gente simples mas honrada, onde cabiam os mais vulneráveis, e os poucos que possuíam um curso académico, caminhavam lado a lado descontraidamente com os que não lhes foi dada a possibilidade de estudar bem longe dos lugares onde nasceram, Se não estou em erro poucos foram além do professorado primário, e muitos deles sem magistério, apenas com o 7º 5º e 2º anos da escola superior. O solo de Murçós fértil em minérios ajudou muitas famílias a melhorar o cotidiano. Em Rebordainhos foram as batatas e cereais. Recordo-me imensas vezes os relatos do tio António Valongo, conversando enquanto saboreávamos o sol junto da casa do meu amigo Reis. A imigração veio trazer grandes benefícios, mas as mentalidades não seguiram o ritmo. O carvão foi para alguns o único meio de sobrevivência – dizia-me o tio Valongo. Depois veio o negócio ilegal do minério que permitiu dar uma formação aos filhos, com perícia e astúcia, como os banqueiros do povo em Rebordainhos, que fruíam de uns patacos, emprestando-os a juros exorbitantes. Hoje são Aldeias fantasmas, as raízes dos oriundos apodreceram, e os próprios tem asco de terras selvagens quando possuem mancões com relva piscina e casa do campo onde podem fruir de todo o conforto. O que foram os pais e avós, são histórias da carochinha, que uma borracha apagou para sempre. Alguns ainda vem por vaidade, para mostrar o que são, e os automóveis de topo de gama, orgulhosos por terem e serem mais do que aqueles um dia foram respeitados a quem eles vergaram o dorso por uma codea de pão. Todos temos o direito de viver respeitosamente, sem necessitarmos provocar, reconhecendo o que fomos e de onde viemos, com a simplicidade que nos caracteriza, sem seguirmos lições moralistas de qualquer religião que seja. A humildade entra em todo lado o egoísmo encontrará barreiras

Sem comentários: