quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Confissões intimas

 Confissões intimas: ficção por António Braz
Herénia, nasceu de um acidente sexual, entre um homem casado e uma moça de dezassete anos. Coibida pelos progenitores desde a sua mais tenra idade, vivia um sequestro parental, e seguida para onde quer que fosse passo a passo e rédea curta, porque, conservadores católicos, desejavam – diziam eles – levar a sua pérola rara, ao altar, virgem como a Santíssima. Porém, a moça carregava hormonas fisiológicas atípicas, e quando completou os seus onze anos, recorria frequentemente a métodos específicos para satisfazer os seus desejos intensos no alapar da indiscrição, gemendo e contorcendo-se como uma tempestade incomum. Numerosas vezes, em estado de êxtase, com a porta do quarto fechada por dentro a sete chaves, sentiu junto da fechadura, um respirar afagado, talvez do pai ou da mãe, o que a levava a restringir o elenco dos neurônios com um estresse metabólico. Nas aulas, procurava as companhias de rapazes desinibidos, mais velhos, e de uma fisionomia machista, mas, vigiados pela pide do colégio das freiras, as hipóteses de ter relações com um deles, como tanto desejava, tornavam-se impossíveis.
 Os anos foram passando e a mãe de Herédia, já com quinze feitos, não sabia dançar, nem tinha contactos com homens, sempre vigiada como a mona lisa no Louvre… o seu telemóvel, servia apenas para atender chamadas da mãe que lhe ligava dezenas de vezes por dia, bloqueado e depositado na secretária da madre chefe, que vinha interromper as aulas cada vez que lhe ligava… lisonjeada pela instituição escolar e menosprezada por grande parte da turma, sentia uma raiva indignada, por ter nascido naquele lar onde havia materialmente tudo, e sentimentalmente nada. Filha única, refugiava-se nos estudos, atingindo sempre notas extravagantes, sem apraz. Prisioneira no seu próprio corpo, Dakarai, “era este o nome da mãe de Herénia”, Tentou imensas vezes a fuga, tanto de casa como da escola, mas os cães que a vigiavam farejavam cada gesto suspeito, e os patrões pagavam muito bem para estarem de olhos bem abertos. Um certo dia pediu para ir confessar-se. – Porquê filha?! Tu não pecas…
- Toda a gente peca, e é nosso dever confessarmo-nos.
- Lá isso é verdade… mas porquê agora se te confessaste ainda há apenas um mês?
Va lá mãe… não vou fugir com o Sr. Padre?! E não quero ninguém na Igreja a guardar-me porque me incomodam… que esperem cá fora.
- Se tal é o teu desejo… vou dar ordens para…
-- Obrigada
 Vestiu as suas roupas interiores cor-de-rosa, um vestido elegante meio transparente preto, calçou sapatos de salto alto, e pôs um batom caramelo, que fazia sobressair o seu olhar brilhante mas tímido, e o coração palpitava a duzentos por hora. Receava que o seu plano abortasse, depois de tão ponderado e pensado ao pormenor.
Adagalmir, casado, dois filhos com 32 anos de idade, esperava o autocarro todas as manhãs que aquela moça passava para as aulas e lhe lançava um olhar matreiro acompanhado de um leve sorriso. Limitava-se a sorrir-lhe, até que um certo dia viu cair junto dele um papel mano escrito que dizia o seguinte: Gosto de si, mas não lhe posso falar porque os meus pais tem-me sequestrada desde que nasci. Desejo-o com respeito pelo que seja, pelo que é e por tudo que se pode desejar no mundo… porém só existe uma maneira de consumar a minha extroversão que me mina e me destrói por dentro e por fora se por acaso recusar. Ofereço-lhe a minha virgindade em troca de uma traição se por acaso for casado. Apareça no dia 13 deste mês pelas 15 horas na igreja da comunidade do coração reciclado. Entre para o confessionário, puxe a cortina, e deixe a porta aberta até que eu chegue. Se é um homem faça o que lhe peço, depois nunca mais ouvirá falar de mim.
Adagalmir ficou estupefacto, perplexo, desarmado como uma criança sem saber o que fazer com o papel que recebeu de uma moça menor desconhecida que lhe pede como quem chama ao socorro, e ele pobre diabo, foi o sorteado para uma missão que se revelava maléfica.
Ponderou durante toda noite e quando chegou o dia x lá foi ele pé entre pé como se se tratasse de uma armadilha. Mas não era, e tal como escrito esperava-o uma moça esbelta, feliz por o ver ali entregando-se de corpo e alma, a um desconhecido, envolvidos pelo pecado, esquecendo que mais alguém existia no mundo. Foi assim que ficou nomeada: a pecadora da qual nasceu 9 meses depois Herénia a filha do pecado.




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