sábado, 12 de setembro de 2020

Dia de sorte III

Na grande quinta do Sr, Carlos Alves e da Sra. Efigénia, vivia-se como num paraíso terrestre… estava totalmente vedada, e na entrada uns grandes portões de ferro, comandados eletricamente, onde os intrusos esbarravam e temiam os dois cães da serra da estrela, que se passeavam noite e dia dentro da herdade. A casa, colorida lilá e branco, tinha um aspeto terno e acolhedor, enquanto o grande parque arborizado, e a cascata que enchia o lago, onde se deliciavam patos e faisões, deliciava também os olhares daqueles que tinham o privilégio de por lá passar. José era o jardineiro dedicado, tudo brilhava à sua volta, para grande satisfação dos patrões que murmuravam entre eles, enquanto saboreavam o chá da tarde no grande terraço: - Creio que encontramos a pessoa certa para tratar da herdade, Carlos…?

- É realmente um rapaz muito competente e responsável… foi sorte!

Alfredo não tinha voltado a Arcos de Valdevez desde que foi contratado, por razões de transporte, já que o seu velho carro foi ter a uma sucata, ficando-lhe mais cara a reparação que o seu valor, e começava a sentir saudades daqueles que lá deixou, embora tivessem conversas vídeo de vez em quando, das passeatas à beira rio com a mulher que tanto amava, uma rapariga modesta, atenciosa e trabalhadeira, cujo namoro durava desde a adolescência, um dia repleto de magia, quando se encontraram pela primeira vez, num percurso de bicicleta, e um furo na roda da frente de Beatriz, chamou a atenção de um passageiro galante, que se ofereceu para ir procurar o necessário à reparação, e ambos riram às gargalhadas, quando lado a lado seguiram caminho. Voltaram a encontrar-se numa feira mensal, mas apenas 

trocaram ternos olhares e um discreto aceno de mão, porque a rapariga ia acompanhada dos pais… contudo trazia numa mão fechada, um papel com o numero de telemóvel, que discretamente deixou cair intencionalmente não passando despercebido ao Alfredo que se apressou a recuperá-lo. A discrição durou secretamente durante cinco anos, e só quando os dois atingiram a maior idade, contaram aos familiares os quais aceitaram de bom grado, sendo os dois do mesmo meio social, famílias honestas e trabalhadeiras.

Era fim-de-semana, um dia de Outono esplendoroso cujos raios de sol projetados nas árvores que se despiam, contrastava com um colorido apaziguador, e as folhas mortas despediam-se sem lamúrias nem contestações, aceitando resignadas o destino de um sículo, quando José apareceu na herdade dos avós, acompanhado de uma rapariga baixa, morena, que apresentou como sendo sua namorada. Foram-lhe mostrados os aposentos e por exigência da moça em quartos separados.

- Queres acompanhar-me? - Perguntou José à Cindy, depois de ter mudado de roupa.

- Onde vamos? – Visitar um grande amigo que deve andar algures por aí a jardinar.

- Um amigo jardineiro!?

- Sim. É o Alfredo, aquele rapaz que te falei…

- Queres dizer que não pareaste de falar dele… é assim tão importante para ti?

- Sim, é…

- E eu não sou importante para me abandonares onde não conheço ninguém?

- Vai ter com os meus avós, que são mesmo fixes!

E sem pronunciar mais palavra desata a correr à procura do amigo Alfredo, o qual mal o viu veio ao seu encontro para lhe dar um abraço bem apertado. Era talvez uma maneira de matar as saudades da sua terra e daquelas gentes que tanto amava. (continua)


 

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