quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Tatuagens


Gerações. ficção
Nasceram nos tempos onde o modernismo e as novas tecnologias são fatores essenciais para o desenvolvimento das atividades facultativas e prejudiciais em aspetos condicionados para a essência natural de congregar o egocentrismo.
 Ele chamava-se Agamenon, de origem grega que significa: persistente.
A ela chamemos-lhe ABRA; de origem hebraica que significa: mãe das multidões
Agamenon nasceu numa nobilita casa pecuniosa junto à margem do rio Mondego, onde viveu a sua infância de menino mimado cujos progenitores jamais deixaram que lhe faltasse o que quer que seja. Era filho único, uma mais-valia – dizia ele mais tarde – quando integrou a universidade em Coimbra – assim não tenho que dividir nada com ninguém. Desde a sua tenra idade, sobretudo quando jogava futebol e se banhava com os outros meninos, que começou a matutar no que o diferenciava dos outro rapazes esperando para ir banhar-se já quando todos os outros tinham saído, e só retirava as roupas íntimas quando verificava que já não havia ninguém nos vestiários. Os colegas chamavam-lhe o retardatário, considerado por ele inofensivo, sendo cada vez mais e mais acentuadas as diferenças entre eles. Os seus órgãos genitais não acompanhavam o crescimento natural do corpo, a timidez e a maneira como se sentia bem entre homens era agora para ele uma realidade que o martirizavam! Seus pais conservadores jamais aceitariam que aquele filho a quem tinham dado tudo, e agora fazia projetos a longo prazo, de ter netinhos que viessem alegrar aquela confortável casa, a qual com o envelhecimento dos proprietários se vinha tornando de uma pacatez desconfortante, fosse homossexual. Optou por guardar bem guardado o segredo que nem aos seus melhores amigos revelou, e com o decorrer do tempo se veria…


Ela, Abra, vivia em Viseu com os seus pais. Tinha dois irmãos mais velhos que já tinham “espolinhado”, um deles casado, outro vivia com uma catraia e por lá governavam a vida, com a ajudinha de vezes em quando da paternidade, porque nos tempos que correm o dinheiro não chega para limar as arestas dos magros salários, sobretudo no início das carreiras. Tinham formação superior, porém, os contratos temporários terminavam e o ciclo vicioso arrancava não podendo estabilizar ora ele ora ela. Abra estudava direito em Coimbra e foi lá que conheceu Agamenon, numa daquelas praxes idêntica à da praia do Meco onde o impetuoso sucumbiu ao dominador psicopata; ordena a jovens vulneráveis que vendem os olhos com uma lista preta, volta a ordenar que voltem as costas ao mar para serem engolidos pelas ondas, e foge como um ladrão, a quem não pesa na consciência, a terrível dor, daqueles pais amargurados, em condições diferentes, que os aproximaram de uma amizade terna, porque ambos tiveram a coragem de dizer não. Nós não alinhamos em disparates deste género.
Durante os cursos encontravam-se imensas vezes. Chegaram mesmo a alugar um pequeno apartamento só para os dois. As más-línguas chamavam-lhe o casalinho e eles apenas sorriam… confiavam cegamente um no outro, pelo que as confidencialidades surgiam enquanto estudavam no aconchego do sofá e na discrição daquelas paredes. Podiam dormir juntos na cama para se fazerem companhia, e, neste aconchego, os seus corpos tocavam-se sem que houvesse qualquer reação perversa. A pedofilia era, por vezes, tema de conversa, e lamentavam que tal como eles aqueles seres humanos tivessem nascido diferentes… não
julgavam receosos de serem julgados, eram quase felizes assim! Os familiares orgulhavam-se do aproveitamento e desempenho, e de tempos a tempos lá vinha a perguntinha: E, como vão esses namoricos? Agamenon respondia com um sorriso forçado: - Estudar não dá tempo para nada… enquanto Abra respondia com rebeldia: - Metam-se nas vossas vidas… -até que um dia, já depois da queima das fitas, enfiados no baú dos segredos chegaram a um acordo convencional: viveriam juntos como um casalinho, e ninguém precisava de se molestar. Adotariam um filho secretamente, e seriam felizes como as outras pessoas sem discriminações.
Tomaram as diligencias necessárias para a adoção normal, e esperaram, esperaram, até que por fim lhes foi entregue um cesto com um menino enrolado em roupa quente até às orelhas, todos os documentos legalmente emitidos e um adeus e sejam felizes…
Quando estavam sós, Abra pegou no menino e notou que não era como os outros meninos… retirou-lhe as roupinhas e tal uma salamandra o menino tinha tatuagens até às orelhas.


  

Sem comentários: