domingo, 20 de dezembro de 2020

Famílias sem laços nem abraços

Famílias sem laços nem abraços

Por: António Braz Pereira

Antigamente, as famílias eram reconhecidas até à quarta ou quinta geração tal como o ADN, molécula portadora de informação genética, responsável pela transmissão das caraterísticas hereditárias nos seres vivos o exige seja para o bem ou para o mal. Parte delas não eram consideradas, mas os laços esticavam sem pedir o consentimento de ninguém. Havia aqueles que fingiam ignorar quando na vida social os níveis eram diferentes, mas não havia meio de fugir, e de bom ou de mau grado… tentavam separar as águas, como se diz correntemente, mas os rios corriam sempre para o mesmo lado. Antes de expandir os meus míseros conhecimentos sobre o tema, gostaria de dizer que nos tempos em que vivemos, família são considerados filhos pais e netos, e as quezilas pelos mais amados, mais ajudados, mais considerados são frequentes e com consequências desastrosas, envolvendo ferimentos, e até mortes, não esquecendo o corte de relações por tempos indefinidos, talvez porque toda a gente tem tudo mas queriam ter mais, invejas, hipocrisia e desprezo por um par de nozes, ou pelo conhecimento das contas bancárias que numerosas vezes dividem entre eles deixando os progenitores na miséria, encerrados num lar, e, o coração vai deixando de ter alento pouco a pouco e os olhos secaram para sempre.

Havia pobreza, fome e desespero, mas era com dignidade que se sobrevivia noutros tempos. As circunstâncias obrigaram famílias numerosas a partir, nos anos cinquenta para o Brasil, depois para as colónias, à procura de uma vida mais grata, a qual nem todos encontraram. Para o Brasil partiu o tio Manuel e a tia Elisa com cinco filhos já nascidos, dois nasceram em S. Paulo. Pouco a pouco arranjaram dinheiro para se estabelecerem, por conta própria comprando uma padaria familiar. Deles tínhamos apenas notícias de ano a ano, e do tio Zé que também embarcou com eles deixando três filhos ao cargo de uma mulher solteira, que também comeu o pão que o diabo amassou para os criar: reconheceu-os como filhos sem jamais assumir as responsabilidades de um homem, refugiando-se na maior das cobardias, o abandono.

O casal só voltou uma vez a Portugal quando eu tinha por volta dos trinta e sete anos. Diziam que as viagens eram caríssimas, e por lá ficaram. Quando a minha mãe e a tia eram vivas telefonávamos a perguntar 

notícias, depois, faleceram e durante algum tempo correspondi.me por e-mail com a Augusta, e telefonei várias vezes pata ter notícias da tia Elisa que foi a última a falecer. Depois tudo se desmoronou como um castelo de cartas. Conhecíamos-mos apenas por fotos, e conforme a idade foi avançando fomos perdendo o contacto. Ainda tentei através de um familiar em 5º grau que os conhecia, mas fiquei com o sentimento que eramos apenas uns estranhos para eles e não queriam ser incomodados.

A humildade e o respeito pelos outros em todas as situações sociais são fundamentais para andar de cabeça erguida na rua e o coração em paz. Já se sabe que não somos todos iguais, que temos cursos ou apenas uma profissão digna e honesta, que uns vivem bem outros menos bem, mas a passagem por cá está destinada e nada se leva. Gosta de falar de um familiar talvez em 4º que conheci no RI 13 em Vila Real, e reencontrei um ano depois no destacamento de Bragança. Ele tinha sido enviado para Chaves, depois da recruta, e eu para o RTM transmissões do Porto. A minha especialidade foi longa e as notas contaram para escolher o quartel que desejava para prosseguir o serviço militar. Entretanto em Vila real fomos massacrados (o nosso pelotão) por dois vaidosos, um Alferes o outro cabo miliciano, a quem pesavam demais os galões e divisas, e que por certo meteram o chico…

Já em Bragança voltei a encontrar o familiar e amigo Varandas. Uma pessoa extraordinária… para ele também os laços familiares para além dos afetivos tinham um significado especial. Fui convidado um dia de festa a jantar na casa dos pais, e acolhido como verdadeiro familiar. Também eu o considerei sempre, e em tempos de castanhas fui a casa assar três assadores de castanhas que dividimos com outros amigos. Tinha-lhe perdido o rasto, mas um dia aparece-me nas redes sociais, pedindo-me amizade. Não o reconheci na foto, mas o seu apelido tinha ficado guardado na minha memória como um dos nossos. Vive há mais de trinta anos em Toronto, com uma bela e grande família, com boa situação e conforto. Trabalhou sem dúvida duro para conseguir, como todos nós, mas venceu, e eu, fiquei imensamente contente. Ligamos frequentemente por vídeo chamadas, para recordar tempos idos, ou falar de tudo e de nada, mas é o meu primo Varandas.

 


 

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