sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Quando era pequenino

Por António Braz

Quando eu era pequenino, acabado de nascer, ainda mal abria os olhos, já era para te ver…

E foram tantas e tão bonitas as coisas que vi! Na chãera aprendi a nadar, refrescar-me em águas manchadas pelo excesso de uso. Era a nossa praia, onde juntos partilhávamos o prazer dos dias tórridos e a euforia convivial, com risos e gargalhadas, saltando para dentro do tanque de poucos metros cúbicos, como rãs dependentes, como miúdos que brincam em banheiras sem bolhas de sabão perfumado, sem fato de banho sem nada, apenas nós e a felicidade quando o proprietário não vinha barafustar, porque a água saltava quando nós saltávamos, e era necessária para o regadio das batatas que bem perto presenciavam silenciosas e com sede. Nas Bouças, os boieiros jogavam ao fito esperado que os animais enchessem o bulho de erva que pouco tinha de verdejante. No Catrapeiro, junto à ribeira que corria no seu ritmo lento e pousado, vinda do alto de vale-saidouro, o moinho já reformado aguardava a visita dos mais curiosos e que nunca o tinham visto trabalhar… e murmuravam: que pena! : A profissão foi prolongada pelo António moleiro lá para os 




lados de Arufe, mas as moagens acabaram por demolir estes encantadores moinhos, e a graça de quem os viu moer, lentamente, quase grão a grão, mas que beleza aquele rodízio e as enormes pedras redondas, na sua lentidão de quem quer fazer bem feito! Em Vale dos Amieiros perto do local onde o “Puto” escreveu a sua história, o tio Manuel frade e os obreiros juntavam o feno já seco, para ser carregado em dois ou três carros com mestria, e que momentos depois subiam chiando aqueles cominhos sinuosos, puxados por vacas valentes como a situação o exigia. Já há tardinha, quando o sol começava a baixar na serra de Bousende, e os Pereiros refrescavam com a saborosa sombra, era no Prado que se davam os primeiros pontapés na bola. Não eram necessárias, mensagens chamadas, nem ouras 



informações que na época não existiam, para que brevemente se enchesse o largo de jovens famintos de esticar as pernas. Os elementos das equipas eram escolhidos minuciosamente para se defrontarem, por dois elementos, e para decidir quem escolhia em primeiro lugar, jogavam o salto, e o que ganhava escolhia em primeiro e como é óbvio, o atleta mais famoso; também podiam escolher ao medir dos pés, um de cada lado até que se encontravam e quando o pé já não cabia, o outro escolhia.

O campo de futebol ficava a uma distância considerável lá no meio das carvalhas, no local chamado: cabeça pelo que muitas vezes nos ficávamos pela eira do outeiro pertencente ao tio José çuca, o qual numerosas vezes nos prendeu a bola porque saltava para o seu quintal e partíamos-lhe as telhas. Graças aos filhos o jogo quase sempre continuava.

 

Nos fins de semana, sábados á noite ou domingos durante o dia, os bailes, eram o passatempo preferido dos rapazes e das raparigas, embora à noite os pais só autorizassem as filhas se acompanhadas de um familiar próximo. O “mange disques” em voga que um irmão trouxe de França à irmã Mavilde tocava, tocava até fumegar, na casa velha desta, na da Ernestina, no palheiro da Sofia, na casa do cigano, no pátio do tio Alfredo Guerra,  na da Fernanda, e outros locais que pudessem facultar para a prática deste tão desejado divertimento. A palavra e a confiança depositada nas pessoas, eram compridas rigorosamente, embora umas beijocas, e uns desejos mais profundo tentassem os rapazes, como Eva tentou Adão. Porém na minha geração já não se consideravam as mulheres como objetos que servem e se deitam fora… as mentalidades tinham modificado e aprendido com os progenitores, os quais utilizavam métodos agressivos e violentos para mostrar os seus preceitos homem sem vergonha nem responsabilidade cuja fertilidade ficava exclusivamente ao encargo de mulheres solteiras, e até mesmo casadas que guardavam o segredo a sete chaves.

Os flrirts e as relações que abrangiam todas as idades, ideologias e sociedades, manifestavam-se ainda, bem secretamente, levados pelo desejo profundo, ao qual nenhum ser humano pode fugir, tentados constantemente, até que os atos eram consumados, uns revelados os outros que ficaram para sempre nos segredos dos Deuses.

 


 

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