sábado, 28 de maio de 2022

Dia de sorte 50

Dia de sorte 50 por António Brás Para Francisco era um recomeço do zero, num lugar onde não conhecia ninguém, solitariamente dentro de uma casinha, confortável preenchida com todos os requisitos familiares, que faltavam quando voltava do trabalho, ao jantar, num repouso corrompido pela falta de afeto e contato, diante de um televisor cujas imagens fluíam e os sons perdiam-se tornando-se zumbidos que ainda o desesperavam mais. Deitava-se enrolado no sofá como um sem abrigo protegido por cartões onde o receio, a fome e o frio penetravam sem pedir licença, desprezado, ignorado e criticado por quem passa e julga sem saber as razões. Na primeira noite que ali passou, foi tentado numerosas vezes a abandonar este mundo desumano, acabar de vez com o sofrimento que o perseguia e que jamais o deixaria em paz. E nas suas tentativas ouvia a voz da avó, agarrando-o pelo braço, lacrimejando, enquanto um sorriso triste, piedoso, o suplicava com forças extraídas do amor, para ter força, ser corajoso como sempre extrair as más energias e se necessário voltar para junto dele, onde as recriminações se fundem como uma bola de neve, e as belas paisagens enchem o corpo e a alma de paz alegria e felicidade. Tinha passado uma semana, e apenas o trabalho conseguia extirpar, daquele corpo moribundo, tentações maléficas. Foi-lhe lembrado que tinha uns dias de férias, mas não ficou radiante como era suposto. Já tinha ligado duas vezes para os Miller pai e filha esforçando-se em afirmar que vivia muito bem, alegre e feliz, mas quando este lhe pediu o endereço para uma visita ocasional, notou-se o embaraço que não passou despercebido àquele homem generoso, astuto, não compreendendo porque não lhe podia ser facultado o seu endereço. Francisco entrou de férias e ocorreu-lhe a ideia de ir visitar os avós. Era uma longa viagem, e com custos elevados que ele se podia permitir. Chegou de táxi à herdade já a noite começava a cair, lugar sagrado onde se sentia feliz junto das pessoas que mais amava e o primeiro ar que respirou entrou-lhe nos pulmões como um furacão. Bateu à porta e quando o avô a abriu receou o ataque cardíaco; segurou-o e abraçou-o durante longos minutos enquanto a esposa veio ver o que se passava com tanta demora do marido. As lágrimas corriam incessantemente porque a felicidade também faz chorar. Finalmente entraram e o rapaz assentou-se entre os dois para melhor poder responder às perguntas que não tinham sido feitas. Enquanto jantavam um grande silencio invadiu os aposentos. Havia um trocar de olhares, mas as respostas entrasgadas na garganta teimavam em não querer sair. Tinham envelhecido tanto os seus queridos avós! – Meu deus como o tempo passou! Pensava francisco receoso de um dia perde-los para sempre. Mas não queria tristezas. Contou-lhes todo o seu percurso nos estados unidos, e quando terminou a avó curiosa aventurou uma pergunta: - Então não encontraste por lá uma mulher para casar? - Ó mulher que indiscrição vem a ser essa? – Interrompeu de imediato o avô. O Francisco vem cansado de uma tão longa viagem e precisa de descansar. O dia amanheceu radiante tal como Francisco que depois de tomarem o pequeno almoço se preparou para uma saída pela herdade fora. - Ouve Francisco: a minha idade já não permite, e as doenças também não, mas dentro em breve chegará alguém de quem tu gostas muito e tenha a certeza que te acompanhará com alegria e satisfação. Para falarmos, tenho os meus lugares secretos onde a discrição é máxima, pelo que podemos falar de tudo o que quiseres, -- Obrigado avô, alegra-me que não tenha feito julgamentos nem esquecido a nossa última “rondonné” -- Alfredo… és mesmo tu`’ - Claro! Achas que não me pesava na consciência estares cá e não vir ver-te? Esta é a minha família. O Rúben e a Letícia meus filhos e a minha esposa Maria. - Que linda família! Venha daí esse abraço

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