terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Ceifas e Ceifeiros

 Tradições do meu tempo, que pouco a pouco, se vão desvanecendo nas memórias fragilizadas do desinteresse, indiferença, mesmo tendo em conta a persistência de quem lisonjeia, instintivamente com restos notálgicos à mistura…
As Aldeias do Nordeste transmontano, tentam por todos os meios salvaguardar, tradições de atos e feitos, que para bem enfeitaram o quadro das nossas vidas, ou os desmoronaram na cor e enquadramento, tornando-os abstratos. A reconstituição esporádica, com o intuito de implementar às novas gerações aquilo que o vento levou, é, segundo a minha opinião, o retorno no tempo, que nos serve de revolta, de vingança ou simplesmente alivia aquele sentimento de vitimização… Porém, sabendo que qualquer escritor, só atinge o auge da carreira servindo para a posteridade, e se inspira do passado mais que do futuro, e não sendo fã da ficção cientifica, apraz-me ler tudo quanto tiver um relacionamento direto com o antigo, que tal como o vinho do Porto, quanto mais velho, melhor…
Diz o adágio: “em cada terra seu uso a cada roca seu fuso”.
Tive, a noite passada, um sonho relacionado com tantas e variadas tradições que me deu a ideia de escrever qualquer coisa sobre algumas delas
No meu sonho vi planícies verdejantes, encostas cobertas de cereais, que o vento ondulava, como um Mar calmo e sereno… espigas douradas pelo Sol… grupos de ceifeiros cantarolando… um deles segurava o pipo do vinho… outros levavam metidos nos dedos das mãos os chamados “dedais” de sola rija para se protegerem de um acidental corte da “foice,” (ceitoura ou gadanho) pendurados à cintura… havia também o da concertina para animar o cortejo! E, na frente, de cabeça erguida, andar compassado e firme, seguia o patrão… aquele que pagava por isso ordenava… os que ceifavam, à direita, ao centro, à esquerda… os que atavam os “molhos” e os que formavam as “mornalheiras”, como uma escultura, arquitectural, inteligente, fundamental para manter o cereal seco, e a espiga intacta.Vi carros puxados por bois e vacas valentes(acarrejas) corajosos, fieis e merecedores da confiança que o boieiro deposita nos animais, conhecendo-os, educando-os nutrindo-os carinhosamente. Carros de madeira(freixo) feitos pelo carpinteiro da terra, do eixo, rodeiros, varas, engarelas e tarraxas as quais apertadas com um fecho metálico, entoam um chiado significativo de carregado,  consequentemente de abastança.
Numa das grandes eiras havia várias medas, quadradas, rectangulares ou redondas, de grandes e pequenas dimensões, segundo as possibilidades de cada um, mas, todas constituídas com o mesmo formato… espiga para dentro para não humedecer.
Seguem-se as malhas, umas após outras, porque as malhadeiras (debulhadoras) ,que o grande motor de ferro fundido faz manobrar através das numerosas e resistentes correias (enrrezinadas) existentes são poucas, e a “torna jeira) é a maneira  engenhosa de concretizar tarefas árduas que requerem muita gente, ao mesmo tempo.
Foi um bom ano… a “tulha” encheu-se de “grão”, e o patrão respira profundamente, agradece, e dorme toda a noite descansado.



No meu sonho apareceu também uma dobadoira, (alcunha elogiosa para uma mulher dinâmica) a roca e o fuso, que as mulheres, nos tempos livres, sobretudo à noite nas veladas, utilizavam para fiar o linho ou a lã de ovelha,  dividiam em meadas, daí o dito: (não perder o fio à meada) depois juntavam em grandes novelos , para fazer “soquetes” luvas e meias, manualmente, bem quentinhas… assim como os cobertores tecidos artesanalmente.
Nota:  as fotos não são da minha autoria... foram partilhadas em vários lugares do google


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