domingo, 23 de março de 2014

MURÇÓS

 Quem sou eu?
Não me vesti de luto; também não dei a luz ao mundo… mas, padeço. Serei aquela mimosa donzela, de amarelo vestida, que expande através do teu universo, perfumes de alto preço? Ou a Rainha dos sonhos… que em noite de pesadelos, te afaga o rosto? Posso até ser: a avó dos teus netos e a mãe dos teus avós… porque sou velhinha! Já fui amada, respeitada e querida… foi no tempo do amor… naqueles dias em que o sol nascia por detrás da serra e se punha tão longe quanto a distância que nos separa… tu eras tão pequenino! Choravas à noite, no colo daquela que te deu à luz… 
 terias fome ou frio… ela amamentava-te, e eu sorria sabendo que depois dormirias como um anjo… foi no tempo da felicidade… quando tu e eu nos contentávamos com tão pouco! Mas tu partiste… à procura do ouro que apenas brilha… choravas, é verdade… mas as lágrimas secaram, tinhas apenas passado o Lameirão… e eu fiquei, sempre à espera de ver aquela porta abrir-se de novo… o galo que tão bem cantava ao amanhecer também calou o bico… já não se ouve o balido das ovelhas, e um cão ou outro, abandonados, ladram para despertar aqueles que adormeceram para sempre na paz do senhor. As andorinhas, cuja fidelidade, jamais traíram, voltam todos os anos para fazer os ninhos nos beirais que tendem a ruir, já sem brancura… seus filhotes começam a recusar tão longa viagem, sabendo que já muitos colegas desistiram… tentam os Pedreiros colmatar estas ausências, e animar o ambiente pacato, solitário, mas, em vão… receio a condenação perpétua… tenho tanto medo das noites de insonolência, passadas a pensar, recordando com tanta nostalgia, aqueles velhos tempos, em que os sabores e os perfumes, apesar de não abundarem eram verdadeiros! Como era lindo ver um par de namorados, junto da fonte, onde a água pura e cristalina jorrava pacientemente da nascente mãe, rir e falar discretamente, não fossem as paredes falar… lembrar os bailaricos saloios, no palheiro do tio Zé, aos Domingos à tardinha, antes do pôr-do-Sol…as festas e romarias, vestidos com as melhores roupas que havia, asseados…
Nestas casas, a ruir de velhas, nasceram tantos de vós! Por estas ruas, hoje mais asseadas, e quase desertas, passearam tantos sonhos à procura da felicidade prometida… andaram, por cá tantos forasteiros, vindos não se sabe de onde, à procura das riquezas que este solo rico em minerais, lhes proporcionava … abriram-se buracos… extraíram-se os minerais… restam os vestígios dos passageiros apresados… como é fácil esquecer!
O Vale dos meus encantos, deixou de ser brioso… rompem as silvas esta terra fértil, lamentam tanto desprezo os que vem esporadicamente visitar… filhos desta terra: não venham apenas criticar os que não foi feito pelos guardas de serviço… sejam solidários como são orgulhosos… não virem as costas à realidade dos factos… ajudem a recuperar a dignidade da vosso tão reputado berço, que vos “arrolou” acariciou, e que sempre vos receberá de braços abertos e coração palpitante. Murçós.

4 comentários:

Serrana disse...

Por certo, o António, deverá lembrar-se dos bailaricos saloios, nos palheiros de Rebordainhos verdade!? Da água fresca da Fonte Grande, do Espinheiro e das bicas do tanque do Prado!? Como esta,água, não existe em parte alguma!
Faz um apelo aos filhos de Murçós.
… Rompem as silvas esta terra fértil, lamentam tanto desprezo os que vem esporadicamente visitar… filhos desta terra: não venham apenas criticar os que não foi feito pelos guardas de serviço… sejam solidários como são orgulhosos… não virem as costas à realidade dos factos… ajudem a recuperar a dignidade da vosso tão reputado berço, que vos “arrolou” …
Agora, pergunto:
O Sr. António não virou também as costas à terra que o viu nascer e crescer!? Com certeza, que também ela o receberá de braços abertos e coração palpitante. REBORDAINHOS!

antonio disse...

Sim amiga Serrana...lembro-me muito bem, e com tantas saudades dos lugares citados por si...dos palheiros e dos terreiros, das casas
emprestadas para o efeito... aos meus ouvidos chegam ainda as músicas, embora o som enrouquecesse
ligeiramente não rouba o aprumo dos pares "proentos" vaidosos, mostrando a arte e a magia de um revoltear enlouquecedor...
Respondendo ao seu ponto de interrogação: Não, não virei as costas à terra onde nasci e que tanto adoro...E, jamais o farei, enquanto Deus permitir a minha presença neste Mundo... Se a sua referencia tiver outro sentido, posso afirmar, e mesmo gritar bem alto: Se me retiro humildemente, mas com educação, de funções ou cargos por razões pessoais, gostaria que respeitassem a minha decisão, como respeitei quem me humilhou publicamente.
Não serão estes pequenos diferendos que me afastam da terra e das gentes que tanto amo. Abraço amigo e Bem-haja pela visita e comentário

Serrana disse...

Longe de mim, que o meu comentário tenha qualquer outa intenção, senão o querer saber o porquê do seu silêncio e, das suas tão dispersas visitas a Rebordainhos. Também não sei, quais as funções e cargos que desempenhava e, quem o humilhou publicamente. Se alguém o fez só merece desprezo e, de certeza absoluta que não chega aos calcanhares do António.
Bora lá, visitar mais a miúdo a terra que ama e, que por sua vez, ela também o ama a si!

Um abraço

antonio disse...

Recebido com toda a clareza,Serrana "vera"... obrigado pelo incentivo que ficou registado como uma sentença aprazível... permita-me a autonomia que vontade tenho eu...a minha mãe também tem precisado da minha presença junto do seu sofrimento, prostrada numa cama... devo-lho com a maior das justiças, porque também a amo profundamente.
Desejo-lhe do coração tudo de bom, e mais uma vez, grato envio-lhe aquele abraço que já nos é tão familiar.