sábado, 15 de outubro de 2022

Dia de sorte 55

Dia de sorte 55 De regresso às suas casas, depois de terem deixado no internato Fred, as palavras tinham sido escassas durante a viagem, onde um pesado silêncio dizia tudo. O miúdo compreendia as razões tendo assistido ao que naquele quarto foi dito com uma crueldade que quase o traumatizavam. A mãe acostumada a dirigir tudo, tornou-se numa leviana histérica cujo rancor lhe saía pelas guelras, cuspindo veneno de toda a maneira e feitio quando o filho lhe perguntava as verdadeiras razões porque o tinha manobrado daquela maneira tão repugnante que o humilhou para o resto da sua vida. -Era para teu bem e um homem não é maricas? O pai tentou intervir para acalmar os ânimos exaltados, mas foi-lhe ordenado de ficar de boca calada ou quando chegassem iria dormir debaixo da ponte. Francisco sentiu pena daquele que biologicamente era seu pai, com o qual tinha maravilhosas recordações de menino. Porém a palavra que efetivava o julgamento foi nunca mais o voltarem a procurar, vivia só mas possuía várias empresas, que adquiriu com o suor do seu trabalho. Exigiu que quando Fred fosse enviado para junto dele, trouxesse consigo um teste de paternidade, e que nem tentassem forjar o documento que os metia na prisão. Fred, era um rapaz inteligente, dócil e meigo, que no internato aprendeu as boas maneiras, educação, mas os seus sentimentos baralharam-se numa confusão indesejável. A mãe biológica tinha-o visitado cinco vezes apressadamente, durante todos aqueles anos comportando-se como quem está alheio ao que se tinha passado e a gestação de um filho colaborando com as intenções maléficas de uma pessoa consciente dos seus atos repudiantes mas que não mostrava arrependimento, ameaçando o marido de represálias se nem que fosse uma vez, passasse a linha da justiça e da verdade, que destruiu uma família que possuía tudo para ser feliz e se encontrava nas trevas onde prevalecia a discórdia e o sofrimento causados pelo orgulho e ganancia de uma mãe cujo amor, estima e carinho fora substituído por azedumes num dia que não era de sorte. Só no seu quarto, Fred ponderou longamente no que tinha ouvido do passado que até então ignorava, e no futuro junto de um pai que não conhecia, um estranho que também o abandonou do qual nunca teve um único gesto de afeto e carinho como um objeto longínquo á deriva num mar sem águas, vigiado por estrelas sem brilho nem cor envolvido numa neblina, onde não se reconheciam os bons dos maus, nem razões para ter nascido. Porém encontrou naquele desconhecido o apego inexplicável que o puxava com forças maiores às quais não conseguia resistir. Porém a pergunta surgia na sua mente: E se não corre bem? O problema de ele gostar ou não gostar de mulheres não o afetava, tinham-lhe ensinado que não nascemos todos iguais e de preconceitos estava liberto. Perguntava-se se seria possível um dia gostarem um do outro como pai e filho, seguirem em frente, visto já não se poder recuperar nada do passado sem abrir a ferida com a qual os brindou o destino uma pergunta que ficaria em suspenso. Gostava dos avós, mesmo sabendo o que agora sabia sentindo que as esperanças eram vãs de um dia poderem reconciliar-se. Valia mesmo a pena tentar? Era um rapaz corajoso, humilde, mas otimista, pelo que decidiu viajar para terras e gentes desconhecidas à procura da felicidade. Porém tinha surgido a fatalidade que Francisco tanto receava. Foram mais quinze dias ao lado do seu querido avó, não ficando nada por dizer entre eles, faleceu num dia chuvoso, e o neto andava arrasado, leu-lhe o testamento onde lhe legava a quinta dos seus amores, com a obrigação de cuidar da esposa até que fechasse os olhos. Também a idosa acusou a falta do companheiro de uma vida sem percalços, e de dia para dia o seu estado piorava. Francisco permaneceu ao lado deles durante dois meses, era o seu próprio patrão que lhe permitia dispor do tempo utilizando o computador para reuniões e conferências, mas aquela dor martirizava-o dia e noite. Era um amor profundo que o seu coração dedicava aos avós eternamente. Por AB in dia de sorte

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