terça-feira, 4 de outubro de 2022

Uma descrição quase perfeita, de um apaixonado cujo hobby a caça grossa ou miuda, o seu paraiso onde juntamente com os cães se alheiam durante horas sem fim à existencia de prazeres mundanos, aferidos ao peso e à medida de atos ixentos de regras, espairecendo ao sabor da natureza mãe, usufruindo da beleza selvagem, em silencio, onde recolhem o oxigénio e a sensatez de caminhantes errantesque da liberdade que os embala e acaricia com profunda afetuosidade, longe ou perto, gelados mas nunca cansados sendo puxados por cordas invisiveis, criticados, envejados e desconsiderados até que passam com excelência na prova escrita.ROUBEI PARA MOSTRAR A OUTROS COMO EU QUE A VESTIMENTA NÃO FAZ O MONGE. ESPERO SER DESCUPADO Jorge Cèsar Afonso 2 h · Perdizes de montanha transmontanas. Gastando o dia noutra actividade também cinegética, saí nesta abertura de 2022 com os 2 cães de pêna apenas pelas 16h00. Imerso nesta paixão da caça grossa ,há muito não me dedicava às perdizes. Temos neste canto do céu umas poucas das bravas... das de sempre vivendo nestas serranias de parco alimento entre giestas ,esteva e as urzes de Miguel Torga. É uma ave apaixonantemente brava ,bela e difícil. São as galináceas para mim as mais fascinantes das aves de caça. Procura-las é procurar um Graal ,e encontrá-las é encontrar o sagrado. Solta a parelha de cães, o seu buscar era por si só regalo suficiente para este dia de caça. A beleza aumenta à medida que subimos a serra e deixamos para trás a aldeia para um mundo só nosso. Acaricio a sobreposta, é uma arma nova na minha mão. Atirei com ela 2 cartuchos . Cai-me à cara perfeitamente. Não sendo uma westley Richards é uma arma de grande beleza ,produzindo as suas platinas inteiras ainda que falsas um belo efeito. Têm extractores automáticos e algo que até agora abominei ..monogatilho. Sendo monogatilho mecânico e não estando a procurar um Búfalo ferido na palha a segurança transmitida é mais que suficiente. Na cartucheira levo como munição principal uma caixa de mini magnum 42 gramas de chumbo 7 oferecida por um amigo que a comprou por engano há uns vinte anos..nos 2 tiros que dei com eles antes de iniciar a caçada parecem estar bons . Garantiu-me terem sido conservados ao seco numa gaveta do móvel da sala ao longo destes anos...bem ,se falhar algum não estamos a seguir nenhum Leão ferido na palha!! Por entre umas arçanhas depois de um rabear de excitação de Apache salta a primeira perdiz . Entendo o purista que não atira a uma peça que não seja parada pelo seus cães...também eu o fiz nos meus dezanoves e vinte anos. No entanto a evolução foi para mim inversa ..procurando agora aproveitar mais oportunidades em caça prática com perdizes que não se deixam parar regularmente antes do terceiro voo. Dou então fogo nesta Beleza alada que cai seca uns 40 metros abaixo. É apache que a encontra no meio do silveiral ,os festejos são muitos e a alegria entre os três imensa. O Braco duro e bruto como só ele dá-me uma cabeçada no maxilar que comprovo com a mão livre não ter partido. Gosto de cães assim duros ,bravos e rudes. É este bruto dono de uma psicologia fortíssima com a qual não se sente nem quebra minimamente quando corrigido, acatando apenas o recado. É o cão certo para um dono igualmente bruto e sentimental. Seguimos com o dia mais que ganho a encosta ,no alto um esponjadouro recente e uma busca insistente num monte querencioso leva ao levante de uma nova perdiz também esta sozinha ...possivelmente algum caçador de coelho por aqui andou partindo o bando pela manhã ao ser levantado mais que uma vez com os podengos. A forte carga deixa também esta seca num lance a curta distância por entre as giestas altas . Festejamos esta segunda mais realizados que com a primeira, mas contudo já sem a mesma intensidade. Subimos agora para o pico da serra onde quase nenhum caçador vai durante o ano. Levanta de asa aberta uns 300 metros à nossa frente um bando de 5 perdizes. Corro a desviar-me da árvore que me impede acompanhar visualmente a progressão do seu voo. Sigo com a vista durante uns 800 metros a sua rasante depois dobram o cabeço dando já sinais de procurar poisar. Vamos por elas que nos cai a noite encima. Procuro as entradas certas neste mato onde só um javali pode romper. O monte alto ,duro e seco bate no osso das canelas das pernas rasgando . Os meus 2 inexperientes e afoitos ajudantes que tanto gostam de buscar na minha frente seguem-me agora com dificuldade à retaguarda passando no carreiro por mim aberto. Faz-lhe bem picar assim a pele ,é isto que os torna cães de caça distanciando-os do miserável Yorkshire de apartamento. Quase a chegar ao local onde imagino terem poisado começa a ser menos espesso com alguns carreiros de javali que facilitam a progressão e a vista mais desimpedida para atirar. A primeira contudo arrota à minha direita por trás de um pinheiro entre as urzes altas que me impedem vê-la. Estão aqui ,estão aqui!!!!!!!!! Vão levantar uma a uma aos pinguinhos seguras por este matagal e pelo voo largo , do qual não tiveram ainda tempo de recuperar. Falta uma para o cupo. Estão presas Apache, penso enquanto aligeiro o passo batendo de peito contra as urzes procurando subir 30 metros onde penso poderei dominar qualquer levante nas imediações. Chegado ao ponto pretendido levanta o fervoroso Braco a segunda. Pulou na vertical ,subindo como um helicóptero ou um Deus Gerifalte. Na minha mente parece ter parado suspensa no ar ali largos minutos como um televisor que se põe em pausa. Talvez num mundo paralelo a vida tenha continuado . Talvez nos restantes confins do planeta as pessoas falassem freneticamente baixando uma rua de Lisboa, como gotas apertadas pelo rio numa trovoada de Agosto . Talvez uma multidão na Geórgia gritasse pelos Atlanta Braves...não o desminto!!! Mas asseguro que ali no alto da serra o meu mundo parou naquela perdiz suspensa por cima das urzes. Admirei durante esses largos minutos em que o universo parou... o vermelho da sua penugem, tão vermelho como o sangue do Cristo a contrastar com o verde imerso naquele doirado resplandecente deste sol pisco do mágico Outono. Com o meu corpo paralisado aquele largo tempo senti o cheiro das suas penas....no seu olho esbugalhado vi de relance a passagem de toda a sua vida presa por amor aquela terra. Sorvi a sua alma ,a sua existência. Sorri !! Depois desse momento de fascínio entre predador altiva presa alguém ligou novamente o interruptor..talvez o criador disto. Eu que até então estivera ali como boneco ao que se lhe acabou a pilha enebriado ,senti de repente um Brrrrrr ,senti novamente força nas pernas ,nos braços e num mundo acelarado agora 10 vezes os normais 30200 m/s aponto visando aquela massa fascinante que agora seria minha e só minha. No primeiro tiro sinto um tzzzc..o fulminante não deflagrou. Preparado por Africa a não bloquear e manter o sangue frio caso o primeiro tiro não saia ou não surta efeito dou-lhe fogo com o segundo cano. Vantagens do monogatilho mecânico !!. Cai desamparada ,largando penas no ar. Seca,.pensei!! Sabia que as outras 3 estariam ali próximas esperando a sua vez..mas o cupo estava feito e tínhamos agora uma das mais belas criações de Deus morta e para encontrar. Chamo os cães gastando o que restava do dia sem a encontrar levantando outra a que não atirei. Saímos já com a lua posta e o astro rei escondido . Chegados a casa fui recebido com grande alegria por minha avó e minha mãe que grandes apreciadoras da carne destas aves ,mas tinham encomendado na véspera ,preferindo-as ao habitual javali. Deixa um bocado esses bichos grandes e caça mais perdizes e coelhos..é uma caça mais fina insiste por vezes minha avó. Ontem de manhã cedo ali nos dirigimos novamente procurando a ferida. Apache cansado contra o habitual em si abanava a cauda, não fazendo tensões de sair da sua casota. Anda meu caro ,um profissional dorme quando pode. Extrai prazer caçando sem dormir ,sem comer e sem beber. Caça quando pode, e descansa quando pode. Á chegada levantamos ontem segunda feira outra perdiz do bando que ali tinha pernoitado, e se domingo fiquei convicto que estaria ali pendurada no mato em altura onde os perdigueiros não lhe davam alcance...ontem comprovei que caíu de asa e por inexperiência a deixamos abalar.

Sem comentários: