Quinta dos Vales |
lobo Ibérico |
O Sr. guerra, já com idade avançada, de estatura alta, rugas
no rosto, dores repetidas nos joelhos, talvez por se apoiar nelas quando catava
as ervas ruins por entre a cebolas em crescimento, as couves-galegas e penca os feijões talhados e agrupados em
sulcos curtos, porque semeados às”Ganchas” (enxada de bicos), manualmente tendo
em conta a rega efectuada com lentidão, ao longo do sulco, nivelado para melhor
chegar à raiz da plantação, onde a rama também tinha o seu concurso na
preservação da frescura. Trabalhava diariamente naquela casa grande, mandada
construir pelo S.r Ernesto já nos últimos tempos da sua vida, muito à custa dos
pobres aos quais quebrava juros exorbitantes por empréstimo de dinheiro, economizado
no inicio do rentável negócio, na tasca
existente no grande largo da Aldeia. Em frente tinham sido plantados um freixo
e um olmo pelos escolares os quais atingiram uns 20 ou trinta metros de altura
e um diâmetro considerável… podiam estas árvores testemunhar, caso falassem,
grandes e memoráveis acontecimentos, passados ao abrigo do ardente calor de
verão e mesmo quando abrigavam de chuvas ou neves.
descida Lanção |
O P.e João da Trindade Alves, tinha sido colocado nesta
paróquia havia relativamente pouco tempo, e vivia junto com a irmã D. Denérida
e a Mãe. Tinham um “casal” em Viduedo herdado dos pais mas entregue a um
caseiro para a extracção dos rendimentos… aqui tinham também um, para cultivar a maioria dos prédios rústicos,
fortuna deixada pelo taberneiro, ou banqueiro do povo… como lhe quiserem
chamar.
Foi numa destas tardes, quando voltava de um jogo de
bola, na eira do tio Zé Çuca que o tio Artur, familiar afastado, da família
Alves, me abordou, na cozinha, onde eu tentava, ás escondidas da criada Luzia,
comer um pedaço de pão com manteiga, já bem próximos da jantar dizendo: - Amanhã
vamos a Penhas Juntas buscar um rebanho de gado…
que me diz?
_ Ouviste bem… o Sr. P.e disse para te levar comigo. Mas… eu percebo alguma coisa de ovelhas?
Não tens que saber… eu é que vou pastorear… tu limitas-te na retaguarda a verificar que não fica nenhuma para trás.
E onde fica isso?
- Também não te preocupes que lá iremos parar…
Quem nos vai levar?
- HaHaHa! São as pernas rapaz!
Senhora da Serra |
Estava eu muito longe de imaginar a distancia que separa as
duas Aldeias, e o percurso, que nos esperava por entre arvoredos e carreiros,
pois segundo o guia eram atalhos… mas, como diz o adágio “ quem se mete por
atalhos mete-se em trabalhos! Sei hoje, porque na altura não sabia dar apreço à
beleza da paisagem, que nos dirigimos para a Quinta dos Vales, a pés, de cajado
na mão e um farnel composto pela Luzia, que conhecia perfeitamente a Aldeia
onde nos dirigíamos, por ser a sua, onde serviu o P.e João enquanto Pároco aí
durante alguns anos.
Chegávamos perto da Sra da Serra., e já os meus pés manifestavam
dores e as pernas cansaço, mas o pastor improvisado não me deixava grande
margem de escolha…
- Ou andas para a frente ou ficas aí…
Murmurava uns insultos, mas penosamente tentava seguir aquele
homem que mais parecia um “galgo”. A verdade é que tínhamos que trazer de volta
o rebanho para Viduedo ainda no mesmo dia, e voltar para casa, onde chegamos exaustos
já alta noite.
Entretanto tínhamos atravessado a serra da Nogueira,
direcção a Melhe de onde se avistava ao longe a localidade que nos esperava, e
não ajudava nada para a minha motivação…
Atravessamos um ribeiro e estávamos Na Edrosa. Já falta
mouco dizia-me o tio Artur… a mim parecia-me uma eternidade.
Serro de Penhas Juntas |
Finalmente chegamos junto de um grande curral, onde um homem
de grande estatura nos esperava par nos entregar o ditoso rebanho de ovelhas. Este
homem vivia no serro, a uns 800 metros de altitude onde não via nem ouvia ninguém
durante dias a fio. Arrepiaram-se-me os cabelos…
Não tivemos tempo para descansar, uma troca de palavras e lá
íamos nós de volta, conduzindo um rebanho por montes e vales, deveras uma
paisagem de encantar para quem visita de automóvel e sem 80 animais para
conduzir sabendo das numerosas e variadas dificuldades inclusive o ataque
eventual de lobos que nunca tinha visto pessoalmente.
O mais difícil foi para chegar á Senhora da Serra… momentos
antes tínhamos merendado, e retomado forças,
passando Junto de Refoios, descemos direcção a Lanção, e do nosso lado
esquerdo, Rebordãos aparecia airoso e luminoso já ao cair da noite.
Uf! Enfim uma boleia para casa. Foi a cavalo que voltamos ao ponto de
partida, mas aquela noite dormi em sobressaltos.
Penhas juntas |
2 comentários:
São retalhos da vida Sr. António!
São episódios em volta da sua vida, que nos dá a conhecer, mostrando-nos as dificuldades que teve de enfrentar.
Continue a dar-nos a conhecer a sua autobiografia.
Gostei!.. Obrigada por me proporcionar este momento.
Cumprimentos
Olá Sr. Anónimo!(a) Parece ser o único comentador dos "retalhos" que o meu humilde tear tenta recuperar nas memórias do passado a fim de reconstituir a minha história sem pretenções e muito menos preconceitos... é com imenso prazer que o recebo, e com sinceridade agradeço as suas visitas... apesar de certos psicólogos de renome considerarem os elogíos como desmotivação, para mim são incentivos ao que faço, como posso e sei... consciente de que a minha carreira literária se resumirá sempre aos rascunhos biográficos ou de ficção cientifica outrora num quarto, pela noite fora, porque no dia seguinte trabalhava, hoje com muito tempo livre pela frente, embora ainda não tenha o previlégio de ser reformado... se previlégio é?...
Retribúo os cumprimentos
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